sábado, 26 de abril de 2014

Das coisas que calei

Querida F.,

            Talvez querida não seja a palavra mais adequada a esse momento, mas precisava chamá-la de alguma forma. Sinto por escrever esta carta como se tudo fosse muito natural, mas algumas coisas precisavam ser ditas, pois ao arrumar minhas lembranças, achei uma caixa empoeirada, dentro dela havia todas as coisas que omiti ou oprimi por sua causa.
            Primeiramente, gostaria que soubesse que me dói muito saber que nunca me amou o bastante do jeito que sou, mas apenas a farsa que criei pra te agradar. Nunca deixei de tentar te fazer sorrir, nunca quis te magoar e sempre evitei ao máximo isso, mas você nunca notou, ou fingiu não vê meu sofrimento. Impôs-me de formas brutalmente psicológicas como eu deveria agir, passei tanto tempo interpretando por você que cheguei a me esquecer por um tempo de mim.
            Segundo, me dói ainda mais saber que tem esse pensamento errôneo, machista, medieval e que em nenhum dos seus pensamentos vem a minha felicidade. Nunca ligou o quanto sofri, o quanto chorei, o quanto fui forte por você, pensou apenas que era sua vez de se sentir bem, alheia a tudo que eu sentia. Como pode ser assim? Como pode ser tão insensível aos meus sentimentos?
            Em terceiro, sei de muitas coisas escondidas, como fato que desejou minha morte, ou que disse que passaria a me desprezar por não acatar sua vontade, ou ainda, o fato de que eu me arrependeria. Já me arrependo. Arrependo-me de ter me doado a você, de sempre pensar em você antes de mim. Eu poderia ser tão feliz, mas joguei tudo para o alto e no momento em que busquei estar bem você me tratou como se eu fosse um caderno velho no qual você escreveu o que quis, mas quando não havia mais nada a ser escrito ele se tornou inútil, além do que, você não queria mais nada do que tinha anotado e por isso me jogou pra fora de sua vida.
            Nossa relação ou possibilidade de qualquer tipo de aproximação morreu dois anos atrás e eu, ingênua, não quis vê. Pensei que poderia fazer dar certo, mesmo com tantos indícios que não. Mas como poderia eu desistir tão fácil? Na época realmente não sabia, no entanto, isso me custou caro demais. Não pense que vou chorar por nós, porque não posso mais. Já que é pra morrermos, que seja de forma fria, você quis assim e eu vou respeitar sua última vontade em minha vida.
            Um dia, talvez, perceba tudo que fez comigo, espero que não seja tarde demais. Meu corpo aos poucos vai se tornando inerte, meus pensamentos se calando e meu amor por você morrendo. Meu olhar já estava morto, então talvez, você nem venha a notar, mas dentro deles, hoje, há uma tristeza imensurável e você é a maior culpada dela. E eu, vou me calando e definhando enquanto ninguém vem me resgatar.
            Queria que tudo tivesse sido diferente, queria que tivesse me entendido, tentado me amar por mim, queria que tivesse sido o que fora destinada a ser pra mim, mas sempre agiu distante. Engraçado como não aprendeu nada com a vida, engraçado como a história se repetiu e você interpretou os dois papéis. Engraçado como tudo que digo parece um natural adeus, mas não é.

                                                                       Da quase que sempre sua,

                                                                                                                      P.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Ninfa

            Ela era comum, quase não chamava atenção, comia calada. Não sabia amar. Não sabia fuder. Não gozava. Seu prazer era utópico. Andava por ai com ares de quem buscava não se sabe o que. Dormia e sonhava sendo outro ser. Morreu ainda em vida, era inerte até no cantar. Viveu só e foi sempre só, ainda que rodeada de pessoas. Teve em seu fim um alívio, sentiu tesão pela morte, pelo seu próprio fim, por tudo acabar. Acabou.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

A um passarinho

           Ele estava certo, em tudo. Quando paro para escutar suas letras, para recitar cada verso de minha vida colocado em forma de poema, me surpreendo. Ele não me conheceu, não a pessoa, mas descreveu minha alma como ninguém havia feito. E em meio à solidão, a pia de pratos que espera ansiosa e o barulho da TV pela ilusão de ter alguém por perto, me pego escrevendo.
            Resolvi escrever e pensei, sobre o que? Sobre amor, talvez, mas não seja apta a fazê-lo, de fato, ninguém realmente é. Devo saber discorrer melhor sobre ódio, mas não é algo que valha a pena ler. Quem sabe então sobre a esperança, ainda que não me tenha sobrado muita. No fim, é a solidão que me toma, me nina em seus braços, me traz as palavras e o cansaço, meus olhos caem sobre as páginas, sobre o teclado, sobre meus sonhos.
            Não sei de fato o porquê de está escrevendo agora pra você, caro leitor, sobre coisa alguma. Acredito que seja só um desabafo entre linhas para que você me tire o peso, mas não precise carrega-lo, por não saber de fato do que se trata. Devo, no entanto, confessar que nunca gostei de tentar adivinhar o que se esconde nas entre linhas, sempre tive a maldita mania de interpretar erroneamente os fatos.
            Caso lhe sirva de consolo, talvez nem eu saiba do que estou falando, talvez eu só precise conversar. Essas palavras soltas que lhe dedico não são nada além de pensamentos confusos que já estavam me fazendo doer à cabeça e precisavam sair de alguma forma.
            Como eu disse, anteriormente, a solidão caiu sobre meus olhos, eles cansaram de procurar alguém ao redor e se fecharam. Hora de dormir, de sonhar, de buscar algo que a realidade não pode me oferecer. Hora de tentar me reinventar. A você, que agora me tira um pouco do peso que carrego, o meu MUITO OBRIGADO!